12:10. Este número não é importante. O local era. Uma voz ao fundo dizia: "Ainda bem que ela veio... veio na hora certa" e outra que respondia: " Ela disse que tinha antecedentes.. ". Abri os olhos. Uma luz branca cegava os meus olhos ainda anestesiados. Uma cortina que me separava de todos. Ninguém ao meu redor. As vozes tinham-se calado e o silêncio parecia sufocar. Morri e não sei. Onde estou? A última vez que me lembro estava numa sala cheia de máquinas e uma cara familiar dizia-me que eu ia dormir. E acordei. Um homem de branco perguntava-me se estava bem e eu respondi-lhe com uma pergunta sobre as vozes que ouvi. "Não sei, ninguém me disse nada e eu não estava na mesma sala que tu"... Não sei porquê mas aquela resposta não me acalmou. Não abrandou o calor que eu sentia naquele momento como todos os outros de ansiedade. E assim, viria a descobrir, era mentira. Sabia mais do que eu e isso de certa forma, enervou-me.
Trouxe-me chá e bolachas quando eu só queria sair dali. Tirou-me a agulha que só reparei que me magoava quando a puxou de mim. Lembro-me de olhar para a garrafa de soro antes cheia e agora vazia. Quantas horas são? Quanto tempo passou? O que aconteceu? Mas ninguém me respondeu. Veio a cara familiar. Acariciava as minhas pernas enquanto me dizia: "Vieste na altura certa, sabias?". Mais uma vez aquela frase. Dita por outra boca. Respondeu à minha pergunta e acalmou a minha ansiedade. Estava perto de saber o que tinha acontecido.
"Não sabemos ainda o que é mas sei que vieste na hora certa...". Vou morrer? É agora? Se é que me digam para que eu me mentalize pela milésima vez o quanto parva sou sempre que adio os meus sonhos ainda por realizar. Sempre que fico parada a olhar para um computador sem reacção. Todos os dias que vou trabalhar em algo que odeio com todas as forças mas que me deixo ficar por pagarem razoavelmente bem.
"Ainda é cedo para prognósticos. Mas não te preocupes. Vieste na altura certa". Parem de me dizer isso por favor. Há alguma hora certa para estas coisas? Mas calei-me e sorri. Vesti-me e antes de sair porta fora tive de suster a respiração e preparar o que não se prepara. Ter de dizer à minha mãe que tinha ido na hora certa. E logo eu que sempre vou atrasada. E depois ao resto da família.
Agora sentada nesta cadeira onde tantas vezes páro no tempo, dou por mim a pensar que só em ocasiões como estas, é que consigo ver e sentir o peso da herança genética. No mal e no bem. No que me levou ao médico e levou tantos outros perto de mim. Na força que sempre pensei ser exclusiva do meu avô e mãe. No parar o sentimento e deixar que o racional tomasse conta de mim como a minha avó... ahhhh mas eu sou o meu pai também e lá bem no fundo, o medo adormecido está a despertar... Vem o meu irmão e diz: "Tretas". Não. Não são tretas. Só o contacto com aquilo que por vezes me assusta mais que o medo de morrer... realidade.
Daqui a uns dias sei se fui na altura certa ou não. Saberei quem estava dentro de mim e o que queria. Saberei se vai querer luta ou se apenas veio lembrar, que o mal não acontece só aos outros.