Finalmente... não a primavera mas a aproximação ao verão... e foi com este pensamento que saí de casa em direcção a uma esplanada, aproveitando a folga do S. Pedro... sentei-me numa mesa de café e bebi-o...óculos de sol e "espraiada" na cadeira, ao som de... hum... de várias coisas, a observar os demais... Os corpos que se entortavam nas cadeiras ao lado da minha, os estrangeiros mais à frente a delirar com o sítio e eu a delirar com o sítio deles, os casais de namorados tipicamente de domingo, jovens e cheios de sonhos que aquele amor vai durar toda uma vida, desconhecendo o que eu sei, que nestas idades o "para sempre" tem a duração de uma semana, no máximo um mês e que entretanto haverá muitos outros... ou talvez não... mas até lá, vivem o hoje como se fosse já um futuro... De resto, só mesmo as famílias da aldeia que retornam à cidade grande para mais uma tarde de compras no shopping... esse sítio estranho, cheio de luzes e promoções enganosas que os iludem e os fazem esquecer a crise, no meio de compras supérfluas, aumentando ainda mais o bolso roto das calças ... Viro-me para outro lado e dou mais um gole no café... presos ao inverno ficaram aqueles que caminham com o peso do mundo às costas, no outro lado do passeio, alheios ao que se passa à sua volta, semblante carregado, alegria escondida talvez à procura de um bom sítio para se suicidarem... O suicídio não é um acto público, por muito que muitos queiram chamar a atenção... talvez por essa ideia me tenha posto a pensar que um suicida num café nunca chamaria a atenção... por muitas pessoas que estivessem à sua volta, ninguém suspeitaria que aquela pessoa estaria ali não para saborear um café, mas para se matar... assim... como a última ceia que dão a um condenado à morte... com tudo o que querem, sem terem de pagar... um último café, quiçá um bolo e pumba! Foste! Não. Ninguém vai para um café suicidar-se... e os que vão, apenas ameaçam... Não têm os mesmos motivos que alguém que o faz sozinho, longe dos olhares dos outros... Descanso... Não vou ter que assistir a uma morte hoje. E assim fico esperançosa que amanhã vá surgir algo ou alguém que lhes vá mudar o pensamento... Cruzo as pernas... último gole no café... meia de letra no papel... em inglês... língua fácil para mim, diferente e muito mais fácil que a minha... e contra olhares coscuvilheiros dos que se esgueiram na cadeira para tentar ler. Escondida por entre palavras escritas, esqueço-me do quanto odeio domingos... A primavera chegou, o verão está mais perto e hoje, hoje é o primeiro dia do resto da minha vida.
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