Chove sem parar. Molha os tolos. Lavam-se os sem abrigo. As ruas, nunca limpas de forma igual. E eu, na minha alma impermeável vejo-os entre protestos, escondendo-se nas arcadas dos prédios enquanto a alegria vem à rua em forma de crianças que saltam nas poças, gritando mais e mais alto entre cada salpico. Os pais, gritam ao longe como se esta água fosse ácido ou balas perdidas entre a multidão. Eles cresceram e esqueceram-se como serem felizes.
A chuva pára. Voltam os infelizes ainda a olhar o céu na dúvida duma granada a qualquer instante, com medo da simples água e da própria sombra. Escurecem as ruas com os seus mantos, num tom muito mais preto do que este céu pesado e as crianças dão lugar a outras que se arrastam em pernas fracas. Afinal de conta, a chuva não nos lava só da sujidade... Traz apenas a beleza do ser, detrás da comum aparência. Sem ela, eu podia jurar que nunca vi tanta gente deficiente em tão pouco tempo.. Eles caminham... Ora sem uma perna, sem as duas, cochos, ou numa outra qualquer condição que não sei explicar ou pensava já não existir. São todos muito iguais entre si. Denunciam um pecado que entre eles é regra. São todos filhos de casamentos entre parentes e não são uma minoria. São de facto, demasiados. São seres que antes mesmo de nascerem, já estão condenados a não saltar nas poças, a não recuperar as forças que nunca terão e possivelmente, destinados a um outro qualquer parente. E eu sou obrigada a assistir a esta parada de para-anti-olímpicos todos os dias de sol. Lembrando-me que aqui, sou eu a minoria e talvez a defeituosa. Venham por isso mais dias de chuva e tempestade que me façam lembrar que no meio desta estranha realidade, há outra mais normal.
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