sexta-feira, 23 de maio de 2014

Palavras mudas

Acreditarias se te dissesse que sei mais do que corre em ti do que sabes? Se te dissesse que tudo na nossa vida acontece primeiro aos ouvidos dos outros do que em nós mesmos? Que com isso ganhamos defeitos e virtudes que não são nossos? Odeiam-nos sem sabermos porquê, amam-nos pelo que não somos e contam histórias que não retratam a nossa vida ou a nós mesmos.
Acreditarias se te dissesse que tudo isso para mim é pedaço de um bolo estragado que me forçam a comer? Se te dissesse que preferia não comer. Não ouvir. Não saber? Mas os ventos são tão fortes e ruidosos que só tu não os ouves. Todos sabem. Todos ouvem. Todos comem. Com um prazer distorcido e retorcido em mil e uma migalhas bolorentas que contaminam a nossa vida de parasitas invisíveis que nos matam aos poucos, numa morte lenta que só sentimos quando já não há mais nada a dizer. 
E eu calo-me é verdade. Não consinto. Apenas não sou mais do que os outros. Mais do que tu mesmo. Nos pedaços de moral que me restam, não sou ninguém significante. Eu esforço-me por me lembrar de um momento que não tenha errado. Algo que me perdoe a modéstia e me deixe falar. Contar-te que o mundo está cheio de gente má que te idolatra a um ponto obsessivo... Mas quem sou eu? Eu, mal me compreendo a mim. Quem sou eu para julgar os outros? Quem sou eu para os calar desse vício do qual parecem alimentar-se numa constante matança de sede de vigança sem razão? Quem sou eu para dizer que erraste? Quando muitas vezes o erro... Não foi nosso... Eu já tinha dito noutras linhas, noutro texto, noutro discurso em pensamento, numa conversa que nunca aconteceu.. Sou e serei sempre aquela que tudo sabe e nada pode contar.

domingo, 11 de maio de 2014

Time is running out

Já não há tempo para escrever. As linhas deixadas ao abandono, esperam por mãos mais capazes, que as preencham. Com palavras bonitas, curtas ou compridas que embelezem a realidade fria e feia que vivemos.
Não há tempo para falar. As mesas vazias cobertas de pó com as cadeiras deformadas pelo peso do passado, continuam a vista como prova de que um dia houve tempo para nos sentarmos, sozinhos ou acompanhados, escrevendo ou falando com alguém.
Nestes dias em que o tempo não tem tempo, já
 ninguém escreve cartas. Não há tempo para escrever e também não saberiamos o que dizer porque paramos de falar.
Paramos de ouvir. Não por surdez mas por uma estranha forma de agnosia auditiva. Somos nós que nos esquecemos dos sons das palavras, do seu sentido e conscientemente, matamos o contacto.
Do viver em sociedade passamos a ser sós. Egoístas, mesquinhos, calados. Temos todo o tempo do mundo para viver e no entanto preferimos morrer.
Não há futuro num presente que se mata. O suicídio mental tomou conta de nós e esperamos apenas que alguém tenha a coragem que nós não temos e nos desliguem as máquinas.
E eu escrevo. Sentada numa cadeira que insiste em não deformar, sacudindo o pó que se acumula e falando sozinha para não esquecer as palavras ou o som delas. Sei que sou una e talvez um dia não resista mais... assim de repente, faltarem-me as forças e transformar-me em mais uma nesta multidão que se empurra e atropela... Mas até lá falo. Escrevo. Grito. Revolto-me. Na esperança que alguém ouça e acorde deste coma induzido que se instalou.

Out of time

Mais lenha. Acumulas. Guardas mais um tronco de sorriso rasgado. Sabes que te queimas a cada acha que deitas na fogueira mas ages como se nada fosse. Calas a dor da mesma forma que o fazes com as palavras. Em seco. Guardas para ti a ira que acumula, perdes o tempo e a oportunidade certa de a cuspir a quem a merece e lanças mais um tronco. Até quando? Por quanto tempo vais guardar-te da verdade? E eu aqui. Sentada à espera do dia D. Vejo como através dos teus gestos, acendes o rastilho da bomba que não conseguiste acender com palavras. Falta pouco. Anos de acumulação têm peso de bomba atómica. Será que os outros estão preparados?
A bomba vai explodir e tu és o primeiro a querer fugir. Tarde demais. A bomba é tua e de mais ninguém, estás preso a ela. Vai explodir e serás tu a receber o maior impacto... Os outros, receberão apenas os restos de pó e pólvora. Palavras distantes e sem importância para eles.
E eu aqui sentada, serei eternamente aquela que tudo sabe mas nada te pode contar. E desculpa se sei disto tudo e continuo calada. Na boca tenho um trapo que me emudece e uma perna presa à cadeira. Desta vez não te posso ajudar porque essa cama, foste tu que a fizeste... Só te resta dormires nela.

Insolúveis

Somos a àgua e óleo que nunca se unem. Quando fervemos, há a ilusão que nos unimos momentaneamente mas assim que se apaga o lume, voltamos a ir cada um para o seu canto.
Somos feitos de diferentes  matérias. Fervemos a diferentes temperaturas e nunca seremos um realmente.
E podemos fingir que sim, que andamos de mãos dadas, que seremos felizes e gritarmos que seremos eternos mas isso é apenas uma negação de uma realidade triste mas verdadeira.
Eu e tu, somos sempre os que andam e dançam lado a lado mas nunca um com o outro.